27 de maio de 2008

Piano

Por um momento sentiu-se sufocada. Fugiu a passos nervosos para a rua, sentou-se na varanda, no precipício do arranha-céus. Perdida nos seus pensamentos, não sentia o frio a morder-lhe as faces. Algumas gotas começaram a cair e ela nem reparou, ouvia com atenção um som próximo e suave. Piano.
As teclas gemiam e rasgavam a noite, sustinham a correria da cidade por um instante. Tudo parecia silencioso, as estrelas bebiam sedentas daquela alma desfeita em notas musicais e ela permanecia imóvel, de olhos fechados e o coração escancarado. A melodia dançava no vento, preenchia o ar como um aroma agradável que não se quer esquecer.
Sentiu uma gota fria cair-lhe no joelho, mas não se inquietou. Muitas outras caíram sobre o fim do dia e ela não foi capaz de ser levantar, não enquanto aquele piano tocasse. As notas eram carícias, como doces palavras que se dizem em noites de luar e a noite chegava, embalada pelos acordes certeiros e sofridos.
Quem estaria a tocar? Não sabia, mas tinha a certeza de que permaneceria ali até o silêncio chegar. Imaginou serenamente as mãos de alguém a dançarem nas teclas neutras de um piano de cauda, o coração acelerado de quem tocava ao ver que o piano traduzia sentimentos...quase foi capaz de sentir a sua respiração ritmar a harmonia da música.
E o piano cessou, passados segundos, minutos, horas...talvez dias. E ela sentia a pele gelada e molhada, mas a alma quente e sossegada.

16 de maio de 2008

Mais um passo, um avanço. Levamos nos bolsos as juras de mais sorrisos, as promessas de abraços futuros. Guardamos nos olhos o brilho daqueles que nos fizeram felizes nestes três anos.
E as memórias abrigam os momentos marcantes,:tristes ou alegres, aflitivos ou descontraídos. Cada segundo foi parte de uma vida que partilhámos, uma vida que partilharemos para sempre por muito afastadas que estejam as nossas mãos.
E agora...carregamos nos ombros as certezas do que aprendemos, as dúvidas do que virá. E com a voz embargada e a garganta apertada mostramos com orgulho os sentimentos, as pessoas que nos mudaram, que nos fizeram crescer. O tempo escorre-nos pelos dedos a cada pôr-do-sol desta cidade, a cada meia-noite cantada em serenata sabemos não poder voltar atrás. Angustia-se o coração e os pulmões encolhem-se no peito. Capas negras de saudade, dizem. S-a-u-d-a-d-e. Sim, capas que nos aquecem os ombros e disfarçam as lágrimas que caem. Capas que são portas para outras vidas, outras emoções. Capas que nos protegem e resguardam nas frias noites em que nos faltam partes da alma.
Estendo a minha capa a vocês, à partilha de sorrisos, às mãos dadas no meio do choro, aos abraços apertados e às palavras especiais...a Lisboa, uma cidade que soube amar por vocês, com vocês. Tudo isto aprendi convosco...tudo isto é muito mais do que eu posso dizer. Muito mais do que poderei agradecer, por isso deixo que os meus olhos o façam por mim.


Vou sentir falta de tudo: das gargalhadas nos corredores, das conversas longas nas escadas, do jogo da forca, das parvoíces, das tardes nos bancos de madeira, das tardes na Gulbenkian, dos passeios, das brincadeiras, dos risos de todos e de cada um. Mas acima de tudo dos vossos sorrisos à minha volta....


E todos sabemos que as fotografias nunca apanham TODA a gente, não quer dizer que não estejam no nosso coração.