25 de novembro de 2006

O corpo esticado ao longo do colchão, um braço a pender do lado direito, o olhar fixo no lençol. Lá fora a chuva cai ritmada, insistente...o sol já não espreita tímido pela janela, cansado de tanto brilhar. As tuas palavras ecoam-lhe nos pulmões, na cabeça, latejam-lhe nas mãos. Os pensamentos escorrem da mente para o coração e do coração para a pele que queima com a força de uma tempestade no mar.
O teu olhar destrói as palavras, desfaz tudo o que acompanha. Deixas um rasto de fogo e cinzas nas pessoas que amas, quem entra no teu coração só consegue sair de lá amachucado. Há quem te diga que tens o coração sobrelotado e que as pessoas se espezinham lá dentro...tu ris e nunca pensas em acreditar.
Fecha os olhos, não tem forças para chorar, as costas desprotegidas parecem mais fortes que nunca mas por dentro só deixaste folhas amarrotadas, cartas que escrevias ao som de dois corações a bater em uníssono e que nunca foste capaz de acabar. Os pés gelados começam a incomodar o corpo estático, tornaste-te tão físico e não passaste duma brisa agradável mas com a capacidade de deixar alguém de cama. O pescoço começa a doer. Vira a cabeça para o outro lado e involuntariamente vê uma fotografia tua, fecha os olhos e pela primeira vez obriga-se a respirar...Desaparece...” murmura, desejando exactamente o contrário.

6 de novembro de 2006

E a estrela caíu...


Olhava para a estrela e pedia com força que lhe roubasse a vida. Fixava-a como que a pedir-lhe que descesse e o matasse.
Desistiu...Todo o ódio que tinha naquele olhar desaparecera com um sorriso.
- Vou pedir outro desejo, algo agradável...
E com o mesmo sorriso desejou que todo o ódio, toda a dor e sofrimento que o pudesse atingir se transformasse posteriormente em amor e alegria. Fechou os lábios mas não deixou de sorrir. E a estrela caiu...E chorou por pensar que nem os seus desejos conseguiam durar.
Beatriz subiu as escadas e sentou-se ao seu lado. Perguntou-lhe porque chorava, ele respondeu que a estrela que continha o seu desejo tinha caído, ela sorriu aliviada e o pequeno rapaz, chateado, perguntou-lhe porque ria se a situação era tão triste. Ela respondeu calmamente e explicou que a estrela que caíra não morrera, antes pelo contrário, depois de saber que guardava um desejo dele, viera alojar-se no coraçãozinho magoado do Rodrigo.
E, confuso, o Rodrigo agarrou-se a esse pensamento. Embora não percebesse muito bem o que a sua irmã queria dizer com aquilo. Pôs a mão sobre o peito e sentiu o coração bater, susteve a respiração e procurou o coração brilhante da estrelinha no silêncio da noite. Porém, não o sentiu, nem o ouviu. Indignado perguntou à irmã porque não sentia o coração da estrela, Beatriz pensou na sua mãe e na explicação que lhe tinha sido dada quando também ela não conseguira encontrar um outro coração dentro dela. Sentiu as lágrimas procurarem-lhe os olhos. Fechou-os.
Explicou ao Rodrigo que a estrela se fundira com ele e que o seu coração, agora, servia para os dois.
- Mas se a estrela está dentro de mim, como é que pode realizar o meu desejo?
- Ela não o vai fazer sozinha, vai ajudar-te a fazê-lo. Tu é que o vais realizar, ela só te dar força suficiente para não desistires.
Rodrigo ficou resignado com a resposta. Um sentimento que conhecera após a morte da sua mãe. Mas com a estrela dentro de si não se chateia por se resignar.
Pensou então em guardar mais estrelas dentro de si, mas achou que era cruel roubar as estrelas do céu.


(escrito já em 2003)