Há uns anos dava por mim a colar folhas aos cadernos porque os acabava tão depressa. Hoje dou por mim a coleccionar cadernos vazios.
São fantasmas por entre os livros que leio, à espera de serem exorcizados. São lençóis por usar à espera dos sonhos que ainda tenho por sonhar. São espelhos virados uns para os outros onde ninguém se vê reflectido.
E ficam, permanecem abraçados pelos livros que já li, que não leio e que um dia vou ler. Esperam pacientemente, como se me ouvissem sussurrar "um dia volto a ter tempo para escrever".
Eu olho para eles e vejo-os: orfãos de tinta e caneta, vindos de mãos leitoras e ansiosas, cheias de esperança na entrega de uma chave para uma obra de arte.
Para mim, estes cadernos vazios são preguiça e pressa:
preguiça de desmontar a vida e pressa de a viver.
Mas eu prometo, vou voltar a escrever.